BACH
Concerto de Brandenburgo nº 1 em Fá Maior, BWV 1046
Os seis Concertos de Brandenburgo foram encomendados pelo irmão caçula de Frederico o Grande, o Marquês de Brandenburg-Schwedt, que assim logrou projetar seu nome para a posteridade. Nesse cartão de visitas extraordinário, Bach ofereceu uma amostra dos seus singulares dons de invenção: cada um dos concertos grossos tem formação orquestral diferente.
Dois motivos se revezam ao longo do primeiro movimento: um, feito de duas notas alternadas, por ser tão minimalista parece que o autor estava tentando estabelecer qual seria o tema mais simples capaz de impulsionar uma frase; o outro, de quatro notas ascendentes mais lentas, abre a possibilidade da inserção de novas ideias. Há uma clara divisão entre os naipes instrumentais, que ora tocam juntos, ora se revezam em fascinante jogo de perguntas e respostas. As frases das trompas não se relacionam de maneira óbvia com o que está sendo tocado pelo resto da orquestra, sequestrando assim a atenção do ouvinte.
O sofrido segundo movimento, quase uma improvisação escrita, explora possibilidades harmônicas, ao reexpor o mesmo acorde sucessivamente com mais tensões harmônicas e melódicas e ao atribuir inesperadamente o solo aos baixos. O terceiro movimento, em forma de dança, interrompe o fluxo com surpreendente trecho cantabile. Por último, uma sequência de danças graciosas em partes que se perseguem, contém um trio apenas de madeiras, em tonalidade maior, lírico e lento, que brinca com efeitos de consonância e dissonância; a “Polonaise” apenas com cordas, recicla temas do segundo movimento, com acentos rítmicos inusitados; o “Trio”, a duas trompas e três oboés uníssonos, expõe um caráter simultaneamente nobre e zombeteiro.
Apesar da grandiosidade de seu legado, Bach nunca teve em vida o reconhecimento merecido. Quando consideramos a importância, a criatividade, a beleza e o alcance dessa coleção de concertos, é perturbador sabermos que o Marquês de Brandenburgo jamais pagou pela encomenda.
LAURA RÓNAI é doutora em música, responsável pela cadeira de
flauta transversal na UNIRIO e professora no programa de Pós-Graduação
em Música. É também diretora da Orquestra Barroca da UNIRIO.