Temporada 2024
abril
s t q q s s d
<abril>
segterquaquisexsábdom
25262728293031
123 4 5 6 7
8 9101112 13 14
151617 18 19 20 21
222324 25 26 27 28
293012345
jan fev mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez
PRAÇA JÚLIO PRESTES, Nº 16
01218 020 | SÃO PAULO - SP
+55 11 3367 9500
SEG A SEX – DAS 9h ÀS 18h
17
ago 2016
quarta-feira 22h00 Concertos a Preço Popular
Osesp: Apresentação Especial Pré-Concertos Internacionais


Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo
Brasil Jazz Sinfônica
Marin Alsop regente


Programação
Sujeita a
Alterações
Moraes MOREIRA
Estrepolia Elétrica [arr. Luiz Arruda Paes]
PIXINGUINHA / Benedito LACERDA
1 X 0 [arranjo de Nailor Azevedo (Proveta)]
DOMINGUINHOS e Gilberto GIL / SIVUCA e Glorinha GADELHA
Lamento Sertanejo / Feira de Mangaio [medley em arranjo de Fábio Prado]
Dorival CAYMMI
Suíte Caymmi - História de Pescadores: Excertos [arranjo de Dori Caymmi]
Nelson CAVAQUINHO / CARTOLA
Folhas Secas / O Sol nascerá [medley em arranjo de Tiago Costa]
Tom JOBIM / Vinícius DE MORAES
Garota de Ipanema
Chico BUARQUE / Edu LOBO
Beatriz [arranjo de Nelson Ayres]
Caetano VELOSO
Tropicália [arranjo de Ruriá Duprat]
Milton NASCIMENTO
Milagre dos Peixes [arranjo de César Camargo Mariano e orquestração de Nelson Ayres]
Hermeto PASCOAL / Egberto GISMONTI
Bebê / Frevo [medley em arranjo de André Mehmari]
Ary BARROSO
Aquarela do Brasil [arranjo de Jackson Delano]

 

Bis da Orquestra 

 

Tom JOBIM

Frevo de Orfeu

 

Nelson AYRES

Chiquito no Frevo

 

Tom JOBIM

Frevo de Orfeu

INGRESSOS
  R$ 15,00
  QUARTA-FEIRA 17/AGO/2016 22h00
Sala São Paulo
São Paulo-SP - Brasil
Notas de Programa


A cultura brasileira deve muito de sua identidade moderna à força de invenção desses mestres da música e da poesia, cujas obras ouviremos esta noite, em arranjos especiais para a Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo (Osesp), com 17 músicos convidados da Orquestra Jazz Sinfônica, sob a regência de Marin Alsop, diretora musical da Osesp.


Começamos com Estrepolia Elétrica (1976), de Moraes Moreira, uma das figuras-chave do carnaval baiano. Abre como uma marcha-rancho, imitando os velhos grupos que desfilavam em procissão carnavalesca no início do século 20, depois se transforma num frevo delirante.


1x0 (1949), de Pixinguinha e Benedito Lacerda, é um exemplo tardio de choro, estilo instrumental predominante no Rio há cem anos. Misturando harmonias europeias com ritmos sincopados africanos, e tingindo o virtuosismo de uma discreta melancolia, homenageia Friedenreich, primeiro craque do futebol brasileiro, que marcou um gol contra o Uruguai na primeira final disputada pela seleção, em 1919. (Aplausos para a solista de sax soprano, Paula Valente.)


O número seguinte reúne dois símbolos de uma grande tradição de acordeonistas nordestinos: Dominguinhos (em parceria com Gilberto Gil) e Sivuca (com a mulher, Gloria Gadelha). Primeiro, Lamento Sertanejo (1967); depois, Feira de Mangaio (1979), um baião ou, mais especificamente neste caso festivo, um forró.


Foi Gil quem um dia chamou Dorival Caymmi de “Buda Nagô”, aludindo não só à religião afro-brasileira desse outro baiano essencial, mas também às qualidades de sabedoria, originalidade e atemporalidade de seu cancioneiro. História de Pescadores (1965) é uma suíte que descreve a vida numa comunidade de pescadores, alternadamente grandiosa e trágica. Vamos escutar as duas seções finais: “Velório” e “Canção da Partida”, em arranjo feito pelo filho do compositor – ele mesmo um grande nome da nossa música, Dori Caymmi.


Existem muitos tipos de samba no Brasil. Nelson Cavaquinho e Cartola praticavam um estilo menos extrovertido, muitas vezes atormentado, e poderoso, embora menos conhecido que os sambas de alegria, mais difundidos fora do país. Folhas Secas (1975) é uma canção de lamento pela perda da juventude e faz uso pungente de linhas cromáticas descendentes; O Sol Nascerá (1961) toma a direção oposta, com linhas ascendentes que celebram os contentamentos da maturidade.


O surgimento da Bossa Nova no final dos anos 1950 assinalou um novo tempo para o Brasil e incorpora muitos ideais que o país até hoje jamais concretizou completamente. Por um curto período, tais ideais se realizaram na música, na arquitetura, no futebol, para não falar da política democrática e da educação pública. Garota de Ipanema (1961), de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, permanece o símbolo acabado desse estilo, leve e profundo ao mesmo tempo. A letra fala do desejo impossível de um homem mais velho por uma garota que passa; e a canção se alterna, quase como num filme, entre a visão da moça (primeira e última partes) e as intuições de mortalidade do poeta (parte central).


Seguindo os passos de Jobim, mas já sob as circunstâncias muito diferentes de uma ditadura militar (1964-1985), surgiu toda uma nova geração de compositores brilhantes, com destaque para Chico Buarque e Edu Lobo. Ambos são parceiros em Beatriz (1983), composta para um balé inspirado pelo poema surrealista O Grande Circo Místico, de Jorge de Lima. A letra fala da vida enigmática de uma atriz, ao passo que a melodia descreve um imenso arco, da nota mais baixa (na palavra “chão”), à mais alta (“céu”). Neste lindo arranjo de Nelson Ayres, é a viola quem canta (tocada por Horácio Schaefer, spalla das violas da Osesp).


Ao mesmo tempo como homenagem e confronto com a Bossa Nova, o Tropicalismo de Caetano Veloso irrompeu na cena destinado a mudar para sempre a música brasileira. Sons industriais, slogans e guitarras elétricas aparecem lado a lado com elementos arcaicos da cultura nordestina e estilos internacionais de ponta. O papel do artista também como ativista se tornava evidente num contexto político tenso. Logo depois de compor Tropicália (1968) – visão aterradora da nova capital, Brasília – Caetano foi obrigado a se exilar. Juntamente com Gil, mudou-se para Londres, onde ficou por um ano.


Depois da Bossa Nova e do Tropicalismo, qualquer coisa podia acontecer. E aconteceu. Milton Nascimento, por exemplo, que veio do interior barroco de Minas para acrescentar tons afro-brasileiros altamente originais a uma nova música popular mais próxima do rock e do jazz. Cantor extraordinário, ele se transformou em estrela internacional com uma lista de parceiros como Wayne Shorter, Paul Simon, Herbie Hancock e James Taylor, e é um dos nomes centrais da música nos anos 1970 e 80, autor de canções épicas como Milagre dos Peixes (1973).


Os anos 1970 também testemunharam o surgimento de instrumentistas virtuosísticos como Hermeto Paschoal e Egberto Gismonti. Músicos enciclopédicos, formados tanto pela vanguarda clássica como pela música folclórica e popular, ajudaram a desenvolver o que hoje se transformou numa verdadeira linhagem de música instrumental no Brasil. O arranjo de Bebê, de Hermeto Paschoal, e de Frevo, de Egberto Gismonti, foi escrito por André Mehmari, ele mesmo um dos principais músicos da nova geração de São Paulo.


Não se poderia encerrar esta breve antologia da música brasileira sem falar da mais icônica de todas as canções, Aquarela do Brasil (1939), de Ary Barroso. Composta durante o regime de Getúlio Vargas, foi muito usada para promover o patriotismo. Independentemente disso, parece mesmo tocar num ponto nevrálgico do país, onde se misturam orgulho desbragado e alegria sensual, ainda que triste, e onde muitos polos antagônicos da cultura brasileira parecem afinal se reconciliar.


O país ainda tem um longo caminho pela frente até dar conta de sua própria história e seu próprio potencial. Na música, porém, já deu infinitas provas do que pode ser realizado. Ela segue como fonte de inspiração para todos nós, que acreditamos numa sociedade inclusiva; e nos dá a chance de desfrutar, por alguns momentos que sejam, de uma vida livre, sob o sol do Brasil.

 

ARTHUR NESTROVSKI é o Diretor Artístico da Osesp.

 

Texto traduzido do original em inglês, escrito para o programa do Festival BBC Proms 2016. Tradução de Jayme da Costa Pinto, revista pelo autor.