Pesquisador exemplar e gênio da composição, Béla Bartók mergulhou na busca de fontes folclóricas para sua criação, no que de alguma maneira se encaixa o que por vezes se chama de “nacionalismo musical”. Contudo, tinha espírito eminentemente crítico, em oposição às ideologias que fortaleciam as pseudorraízes nacionais para construir uma superioridade violenta e cruel, como a do nazismo. Daí a sagacidade das formulações que podemos encontrar em seus muitos textos de etnomusicologia: “O pesquisador [de música folclórica] deve esforçar-se para esquecer todo sentimento nacional”; “querer se preservar de influências estrangeiras é retroceder” e “a construção de muralhas da China para separar os povos entre si seria evidentemente nociva ao desenvolvimento [da música folclórica]”.
Já se notou o clima “folclorístico” do Concerto nº 2 Para Violino, de 1937-8. A peça traz também meditações a respeito dos aportes de Debussy e do dodecafonismo vienense — sobre o segundo tema do “Allegro Non Troppo”, Bartók teria dito que queria mostrar a Schoenberg “que é possível empregar a técnica dos doze sons e permanecer tonal”.
O resultado é uma obra que atinge a beleza mais transcendente. Momentos líricos, profundos e melancólicos alternam-se com ritmos que se desencadeiam, ásperos. O Concerto fora encomendado pelo grande violinista Zoltán Székely, amigo e parceiro do compositor. Bartók criou uma partitura de tremenda dificuldade para o solista, colocando em evidência as qualidades do executante. Mas em nenhum momento essas exigências surgem apenas para o brilho do virtuose. Tudo em Bartók é rigor: um homem que, na vida e na arte, recusou sempre todas as concessões. [2009]
JORGE COLI é professor na área de história da arte e da cultura na Unicamp e autor de A Paixão Segundo a Ópera (Perspectiva, 2003).