ENTREVISTA COM PAUL LEWIS
O que você leva em consideração ao selecionar peças para compor um recital?
Conexões e contrastes são aspectos importantes a se considerar na montagem de um programa. É interessante experimentar um tipo de música que tem a capacidade de iluminar os outros trabalhos que formarão o programa. Por um lado, peças que nos são familiares podem soar muito mais radicais quando inseridas num determinado contexto; por outro, um repertório menos conhecido pode parecer mais familiar quando tocado em conjunto com peças de um repertório padrão, com o qual guarda algum nível de contato. Mas o mais importante para mim é que preciso gostar muito de todas as peças que toco.
Você tem uma ligação muito especial com a música de Schubert. Pode nos falar sobre isso e, mais especifi - camente, acerca da Sonata nº 9 , D 575 ?
Schubert é um dos compositores que mais me atraem. Existe algo de muito humano em sua vulnerabilidade e há uma ideia em sua música de que não precisamos sempre encontrar respostas para tudo — algo com que a maioria das pessoas pode se identificar. A Sonata no 9, é uma obra do início da carreira e que ainda não traz todo o peso emocional das sonatas posteriores, mas é incrivelmente inventiva na forma e no percurso harmônico. De certa maneira, é quase experimental.
Você ainda não gravou peças de Brahms. O que poderia dizer sobre as Quatro Baladas e os Três Intermezzos, Op.117 ?
São obras muito diferentes, uma do começo, outra do fim da carreira do compositor, mas que compartilham certos pontos. As Baladas são geralmente obscuras, brutais até. A primeira foi inspirada num poema escocês anônimo, narrando a história de um garoto que confessa à mãe que matou o pai. O primeiro dos Intermezzos também teve por inspiração um poema escocês, em que uma voz feminina lamenta ter sido abandonada, juntamente com seu filho, pelo amado. Ambas as peças têm um conteúdo sombrio, mas a violência da trama da Balada parece casar melhor com a natureza experimental da composição pianística do jovem Brahms, enquanto a suavidade do primeiro Intermezzo tem mais a ver como ao caráter mais sereno do Brahms maduro. São peças maravilhosas; e colocá-las no mesmo programa dá a oportunidade de ouvir de perto como o compositor desenvolveu sua escrita para piano e também como trabalhou com ideias semelhantes, primeiramente na juventude e, depois, na maturidade.
E o que pode dizer de Liszt e da Fantasia Quasi Sonata ?
Para mim, é uma das maiores e mais descritivas obras de Liszt para piano. A tradução musical que ele faz da visão do inferno de Dante tem alcance orquestral — e é dessa maneira que deveria ser abordada por todo pianista que se propuser a tocá-la. A maior qualidade do piano reside na sua capacidade de imitar os sons de uma orquestra completa, de instrumentos individuais, da voz humana etc. Essa peça explora plenamente todas essas possibilidades, além de ser divertidíssima para quem a toca.
Você esteve com a Osesp em 2010 e em 2013; em 2016, será o Artista Residente. Pode nos dizer alguma coisa sobre a perspectiva de voltar a São Paulo duas vezes em 2016?
Adorei visitar São Paulo, gosto muito da cidade desde minha primeira viagem, em 2010. É uma cidade vibrante e artisticamente estimulante e tive a sorte de poder comparecer a concertos e mostras de arte nas viagens anteriores. E também comi muito bem! Espero ansiosamente pela oportunidade de conhecer a cidade ainda melhor.
Entrevista a RICARDO TEPERMAN. Tradução de Jayme Costa Pinto.