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PRAÇA JÚLIO PRESTES, Nº 16
01218 020 | SÃO PAULO - SP
+55 11 3367 9500
SEG A SEX – DAS 9h ÀS 18h
23
abr 2016
sábado 16h30 Imbuia
Osesp: Alsop e Lewis


Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo
Marin Alsop regente
Paul Lewis piano


Programação
Sujeita a
Alterações
Wolfgang A. MOZART
A Flauta Mágica, KV 620: Abertura
Concerto nº 12 para Piano em Lá maior, KV 414
Sergei PROKOFIEV
Sinfonia nº 7 em dó sustenido menor, Op.131
INGRESSOS
  Entre R$ 42,00 e R$ 194,00
  SÁBADO 23/ABR/2016 16h30
Sala São Paulo
São Paulo-SP - Brasil
Notas de Programa

 

Muita tinta foi gasta com a intenção de interpretar, apreciar e criticar A Flauta Mágica, a última ópera de Mozart, cuja estreia ocorreu no dia 30 de setembro de 1791 em Viena, no Theater auf der Wieden. O libreto ficou ao encargo de Emanuel Schikaneder — cuja companhia atuava no teatro desde 1789 —, colega de loja maçônica de Mozart. O compositor aproximou-se da trupe que cercava Schikaneder, e a ópera foi concebida quase como uma ação entre amigos. Não por acaso, o grupo teve presença marcante na primeira encenação: o tenor Benedikt Schack, amigo íntimo de Mozart, fez o príncipe Tamino, e o próprio Schikaneder atuou como Papageno, personagem carismático que quase sempre rouba a cena e a simpatia de todos que assistem à ópera.

 

No caso do libreto, as referências literárias e teatrais também eram ligadas ao grupo. A inspiração vinha de contos de fadas, como Lulu oder die Zauberfl öte [Lulu ou a Flauta Mágica], escrito por Christoph Wieland e publicado numa coleção em 1789; os elementos mágicos foram retirados da peça Megara, de Philipp Hafner, de 1763; os rituais da maçonaria saíram diretamente de um romance de Jean Terrasson editado em 1731 e todo ambientado no Egito. Isso sem se esquecer das várias passagens cômicas, que traziam referências do teatro popular vienense. Muito se comentou também sobre os símbolos maçônicos distribuídos por todo o enredo, a começar pelo toque de três acordes nos primeiros compassos da “Abertura”.

 

No entanto, para além desses elementos mais pontuais, é possível reconhecer como toda a ópera respira o contexto nervoso do seu momento de nascimento. Se Mozart enfrentava dificuldades financeiras e emocionais, quem sabe vale arriscar dizer que não só ele, mas boa parte da Europa andava perplexa. Essa é a época da eclosão da Revolução Francesa, que colocou em questão os grandes valores do Velho Mundo, dentre eles o poder absoluto e divino da realeza, a corte e a sociedade estamental, a nobreza e sua cordialidade.

 

Mas obras culturais não se comportam apenas como expressão e produto do seu momento político. Ao guardar ressonâncias, alusões, ambiguidades e contradições de época, elas também anunciam, fazem prognósticos e inventam um mundo novo. A Flauta Mágica, com sua carga elevada de simbolismo e grandes doses de humor, faz tudo isso e à sua maneira: com o estilo pretensamente descompromissado de Mozart.

 

Pode-se dizer que a peça apresenta um grande teatro de luz e sombra; um combate cujo instrumento é o amor. Só ele pode garantir a derrota da escuridão e a vitória das luzes: o estabelecimento derradeiro do iluminismo como filosofia política e utopia partilhada. Por meio do amor, tudo conflui para uma nova era, um novo mundo de luz diurna. [...] [2014]

 

LILIA MORITZ SCHWARCZ é professora titular no departamento de antropologia da USP, global scholar na Universidade de Princeton (Estados Unidos) e membro do conselho de administração da Fundação Osesp. Publicou As Barbas do Imperador: D. Pedro II, um Monarca Nos Trópicos (Companhia das Letras, 1998) e O Sol do Brasil (Companhia das Letras, 2008), entre outros livros.

 

 

 

Uma das relações trabalhistas mais tristemente famosas da história das artes foi a que uniu Mozart e Hieronymus Von Colloredo, príncipe-arcebispo de Salzburgo, conhecido por ser autoritário, arrogante e pouco generoso. Foi para se livrar do jugo desse patrão antipático que Mozart resolveu tentar a sorte em Viena, como músico independente. Os quatro anos que se seguiram, com altos e baixos financeiros, foram bastante produtivos, e a reputação de Mozart como compositor e solista cristalizou-se. As obras desse período são permeadas pela sensação de liberdade recém-conquistada.

 

Durante a estadia em Viena, Mozart comporia um número notável de concertos para piano. Dentre esses, o Concerto nº 12, escrito para a temporada musical do inverno de 1782, caracteriza-se pela construção límpida, pelo equilíbrio formal, pela invenção melódica inesgotável e, principalmente, pela escrita hábil, de resultados imediatos, que anuncia as grandes qualidades da música de maturidade do compositor.

 

A tonalidade é Lá Maior, que, para Mozart, simbolizava em geral lirismo e serenidade, com poucos desvios para tons menores. Mesmo o solene “Andante” central, em Ré, em que é citado um tema de Johann Christian Bach, amigo e mentor de Mozart, falecido no início daquele ano, mantém-se sobriamente ancorado à melancolia, sem recorrer a grandes dilaceramentos emotivos. No “Allegretto” final, um rondó enganadoramente gracioso e ligeiro, recursos sofisticados de composição ficam ocultos como os fios que movimentam as marionetes. Em carta ao pai, o próprio Mozart descreveria esta obra como “um meio termo feliz entre pesada demais e leve demais. Brilhante, agradável ao ouvido e natural, sem ser insípida.” 1

 

A ambição modesta do concerto, no que tange à escrita orquestral (é quase uma peça de câmara, em que a orquestra pode ser facilmente substituída por um quarteto de cordas), é uma questão meramente comercial: Mozart pretendia vender a edição dos concertos por assinatura para diletantes abastados, numa espécie de “financiamento coletivo”. O esquema não funcionou, mas felizmente para nós o Concerto acabou sendo publicado pela editora Artaria. Por conta disso, as cadenzas constam da partitura — normalmente eram improvisadas —, o que nos oferece uma verdadeira janela para o estilo de interpretação do compositor.

 

1. Keefe, Simon P. (org.). The Cambridge Companion to Mozart. Cambridge: Cambridge University Press, 2003.

 

LAURA RÓNAI é fl autista, professora na UniRio e autora de Em Busca de um Mundo Perdido: Métodos de Flauta do Barroco ao Século XX (Topbooks, 2008).