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SEG A SEX – DAS 9h ÀS 18h
19
nov 2015
quinta-feira 21h00 Jacarandá
Temporada Osesp: Mechetti e Müller-Schott


Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo
Fabio Mechetti regente
Daniel Müller-Schott violoncelo


Programação
Sujeita a
Alterações
Robert SCHUMANN
Manfred, Op.115: Abertura
Concerto Para Violoncelo em Lá Menor, Op.129
Richard STRAUSS
Uma Vida de Herói, Op.40
INGRESSOS
  Entre R$ 45,00 e R$ 178,00
  QUINTA-FEIRA 19/NOV/2015 21h00
Sala São Paulo
São Paulo-SP - Brasil

Leia o ensaio Richard Strauss, de Edward Said.

Notas de Programa

 

O herói romântico descreve a trajetória de exceção do protagonista diferente desdobrada em seu eu, que se rebela contra as leis, normas ou convenções estabelecidas. É seu o mote do Werther de Goethe: “Volto-me para mim mesmo e descubro um mundo”.


O rebeldismo romântico tem como matriz a liberdade individual que a Revolução Francesa transformou em programa político, liberdade esta encarnada na figura de Napoleão Bonaparte. Num certo sentido, o romantismo alemão consiste numa reação ao “senhor da guerra”, Napoleão. Lembremo- nos da célebre descrição que faz Hegel de Bonaparte passando em revista as suas tropas no dia da Batalha de Jena, em 13 de outubro de 1806, no momento em que aquele concluía a sua Fenomenologia do Espírito. “Eu vi o imperador — esta alma do mundo — sair da cidade para admirar o seu reino; é realmente uma sensação maravilhosa ver tal indivíduo que, concentrado num ponto, montado a cavalo, se estende sobre o mundo e o domina”.1


O herói romântico é precisamente essa anima mundi, o ponto subjetivo que abarca com sua figura o mundo concreto. Um pouco antes, em 1804, Beet hoven intitulara a sua Sinfonia nº 3, “Bonaparte”, em homenagem ao cônsul francês, que atualizava a República romana na modernidade, encarnando valores antimonárquicos. Quando Napoleão se torna imperador, no mesmo ano, Beethoven retira o título da sinfonia, que passará a ser chamada de Eroica. Entre a efusão de Hegel e a rebelião de Beethoven temos o vasto espectro da ambivalência romântica com relação a Napoleão, matriz histórica de todas as figuras românticas do herói. 


O poema sinfônico, ou “poema tonal”, Uma Vida de Herói [Ein Heldenleben], de Richard Strauss, narra precisamente a história de um herói deste tipo. A referência é explicitamente à Eroica de Beethoven, de que Strauss guarda a tonalidade de Mi Bemol Maior. O herói é uma projeção do próprio Strauss, como o compositor admitiu a Romain Rolland: “Não vejo porque não devo compor uma sinfonia sobre mim mesmo; acho-me tão interessante quanto Napoleão ou Alexandre”.2

 

Strauss desenvolve a técnica da música de programa proposta por Liszt como resposta ao poema dramático wagneriano. Em “O Herói” abundam as trompas, como “medida do heroísmo”, diz o compositor. No movimento seguinte, “Os Adversários do Herói”, a música alfineta os críticos que comentaram negativamente a obra de Strauss, com figuras rápidas de flautas, clarinetes e oboés (que deveriam “rosnar”).


O segmento “A Companheira do Herói” nos apresenta a sua mulher, a soprano Pauline de Ahna, representada pelo violino solo. A seção “O Campo de Batalha” contém passagens ruidosas e dissonantes, extremamente ousadas para a época. Na seção “Esforços Pela Paz”, Strauss relembra motivos de suas obras anteriores: Don Juan, Assim Falou Zaratustra, a ópera Guntram.


Por fim, “A Retirada do Herói e Conclusão” começa com uma melodia pastoral tocada pelas trompas e conclui-se com o retorno da mesma melodia da esposa, Pauline, enunciada pelo violino solo. Os ataques dos críticos ao compositor retornam ainda, mas a violência é apaziguada pela voz da companheira do herói. 


O longo poema narrativo Manfred [1816- 7], de Byron, fornece a Robert Schumann o motivo poético-narrativo de seu melodrama epônimo de 1848. Mais uma vez, trata-se de uma reação ao drama musical wagneriano, mas o procedimento utilizado é oposto ao de Strauss: estilhaçar os motivos em microfiguras sonoras, na variação e na “arte combinatória” de sons. Schumann utiliza-se de meios sonoros puros — quer transformar a literatura em música, e não a música em literatura.


Manfred é a única incursão de Schumann na área da música incidental. Quando compunha o melodrama, ele tinha alucinações auditivas, consequência do quadro de depressão melancólica, que o levou no final da vida a um asilo de loucos. A versão completa da obra, de que ouviremos aqui a “Abertura”, compreende a recitação de trechos do poema de Byron traduzidos para o alemão. O herói fáustico do poema é um jovem marcado pelo pecado, que o poema indica ser a relação incestuosa com uma irmã, referência autobiográfica à relação de Byron com sua meia-irmã, Augusta Leigh. “Ela era como eu em seus traços; seus olhos,/Seu cabelo, suas feições, tudo, até o próprio tom/Da voz, diziam que era como a minha [...]”. A heroína que permanece anônima até o segundo ato do melodrama de Schumman é Astarte, que espelha em “tudo” Manfred, uma versão de si mesmo como mulher. O amor incestuoso sintetiza todo o sentido do amor romântico, alienando o herói da sociedade pelo ato sem nome.


Lord Byron, o autointitulado “Napoleão do verso”, encarna em sua biografia e em seus poemas narrativos, protagonizados por versões sublimadas de si mesmo, o protótipo do herói romântico. Manfred corresponde ao clássico herói melancólico byroniano, anjo decaído, que funde em si mesmo elementos góticos e satânicos, num duplo irônico do anjo celeste.


O início da “Abertura” contém os elementos que serão desdobrados na peça inteira. Os três acordes sincopados no início, em tempo rápido, seguidos de uma mudança abrupta para o tempo lento, numa sequência cromática ascendente, e em seguida por uma descida complementar constituem a matriz de toda a obra. 


O concerto Para Violoncelo em Lá Menor, de Schumann, foi concluído em 1850; trata-se de uma das peças mais enigmáticas da fase final da sua obra. Roland Barthes fala do radicalismo da música de Schumann, talvez o mais romântico dos compositores, ao recusar a arrogância da universalidade e mergulhar na visão brilhante de uma experiência existencial, que se confunde com a loucura, que destrói o sujeito Schumann à medida em que a música se constrói. Em 1856, o compositor falece ao lado de Clara no asilo mental de Endenich, perto de Bonn, realizando em sua própria vida algo da figura trágica do herói romântico.


1. Hegel, G. W. Friedrich. Fenomenologia do Espírito. Petropólis: Vozes, 2000.
2. Rolland, R. e Strauss, R. Gail. Richard Strauss et Romain Rolland: Correspondance, Fragments de Journal. Paris: Albin Michel, 1951.


JOÃO CAMILLO PENNA é professor de Literatura Comparada e Teoria Literária da UFRJ. 

 


PROGRAMA


ROBERT SCHUMANN [1810-56]

Manfred, Op.115: Abertura [1848-9]

12 MIN

 

Concerto Para Violoncelo em Lá Menor, Op.129 [1850]

- Nicht zu schnell [Não Muito Rápido]

- Langsam [Lento]

- Sehr lebhaft [Muito Animado]

23 MIN

 

 

RICHARD STRAUSS [1864-1949]

 

Ein Heldenleben [Uma Vida de Herói], Op.40 [1897-8]

- Der Held [O Herói] - Des Helden Widersacher [Os Adversários do Herói]

- Des Helden Gefährtin [A Companheira do Herói]

- Des Helden Walstatt [O Campo de Batalha]

- Des Helden Friedenswerke [Esforços Pela Paz]

- Des Helden Weltfl ucht und Vollendung [A Retirada do Herói e Conclusão]

45 MIN