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PRAÇA JÚLIO PRESTES, Nº 16
01218 020 | SÃO PAULO - SP
+55 11 3367 9500
SEG A SEX – DAS 9h ÀS 18h
11
set 2014
quinta-feira 10h00 Ensaio Aberto
Ensaio Aberto: Guerrero e Faust


Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo
Giancarlo Guerrero regente
Isabelle Faust violino
Coro da Osesp
Naomi Munakata regente


Programação
Sujeita a
Alterações
Ludwig van BEETHOVEN
Concerto Para Violino em Ré Maior, Op.61
Richard WAGNER
Tannhäuser: Abertura
Tannhäuser: Música de Venusberg
Rienzi: Abertura
INGRESSOS
  R$ 10,00
  QUINTA-FEIRA 11/SET/2014 10h00
Sala São Paulo
São Paulo-SP - Brasil
Notas de Programa

O Concerto Para Violino figura entre as realizações do período médio de Beethoven e que, pela importância no repertório, assombrou quem quis escrever uma nova peça no mesmo gênero. Surpreende que ele não tenha experimentado sucesso imediato, o que sua estreia, em 23 de dezembro de 1806, ajuda a explicar: às vésperas da audição, o solista Franz Clement ainda aguardava a conclusão da partitura. Simbolizaria sua “redescoberta” o êxito londrino em maio de 1844, quando foi executado por Joseph Joachim e regido por Mendelssohn. Joachim firmaria, aliás, a posição essencial do Op.61 na música para violino, apresentando-o mais do que qualquer outro concerto.


Os temas do primeiro movimento demonstram uma placidez que os afasta de uma exaltada retórica beethoveniana. O solista destaca essa qualidade ao ter mais a função de desenvolver o lirismo orquestral do que a de lhe impor antagonismos. Mesmo assim, um pendor paralelo é já de início enunciado pelo tímpano; seu motivo, que remete à música revolucionária francesa, nutre a estrutura a ponto de encabeçar, no tutti, a recapitulação.

O segundo movimento, “Larghetto”, dá um novo perfil à sonoridade — flauta, oboés, trompetes e tímpanos silenciam, cordas soam com surdina — e evita contrastes globais no plano harmônico ao centrar seus temas em Sol Maior. Conecta-se por uma transição ao movimento final, um rondó em que as ocorrências da ideia principal são intercaladas por três episódios. A coda, demasiado longa para os padrões do classicismo de Mozart e Haydn, corresponde a quase um quarto deste belo movimento final.

DANIEL BENTO é pós-doutor em música (Unesp), doutor em comunicação e semiótica (PUC-SP), autor de Beethoven, o Princípio da Modernidade (Annablume/Fapesp, 2002) e A Nona Sinfonia e Seu Duplo (Editora Unesp, 2010).

O período que vai da gênese de Rienzi, em 1837-8, à estreia da versão revisada para Paris de Tannhäuser, em 1861, é um dos mais significativos da vida de Richard Wagner. De todos os compositores que formam os pilares do grande repertório, certamente é a Wagner que se dedica o maior culto. É possível dizer que sua obra transformou a música ocidental do final do século XIX e abriu caminhos para a maior parte das linguagens musicais do século XX. Porém, quando se fala do "mito Wagner” parece existir uma singular distância entre este e o "homem Wagner”.

É possível que muitos "wagnerianos" preferissem saber menos sobre a vida de Richard, um homem de caráter complexo, cujas atitudes nem sempre foram as mais éticas e morais. Domava um destino que lhe era — ou parecia — frequentemente hostil, sim, mas a qualquer preço. De sua pena podia brotar a música mais sublime ou um antissemitismo do mais banal oportunismo. O homem Richard Wagner sempre teve consciência da dimensão histórica de sua vida. Tentou fazer chegar às gerações futuras o que acreditava apropriado, destruindo o indesejável. Foi um hábil forjador de mitos e, mais ainda, um “censor” (tarefa na qual mais tarde sua mulher, Cosima, quase que o superou). Mas são igualmente dos acontecimentos de uma vida, de suas pequenas histórias, que emanam as obras de arte.

No outono de 1859, Wagner deixou a Suíça após dez anos de "exílio". Tinha os bolsos recheados graças à doação sugerida por Mathilde Wesendock ao marido, um rico comerciante de seda. A generosidade de Otto Wesendock ao longo de anos não havia, é verdade, sido empecilho moral para Wagner, que era amante de Mathilde. Felizmente para a história da música, a relação rendera, dois anos antes, inspiração para obras como os Wesendock Lieder e Tristão e Isolda. Ao partir, todavia, seu destino era uma cidade tida como a capital do mundo, sobretudo nas artes: Paris.


Era sua segunda tentativa de triunfar na capital francesa e, consciente da importância do projeto, instalou-se numa confortável casa com jardim perto do Champs Élysées. Alugou o imóvel por três anos e por um valor que, como de hábito, estava acima das suas reais possibilidades financeiras. Queria -- e precisava -- aparentar e receber bem. Contratou um decorador e, de Zurique, mandou buscar os móveis para que, seguindo seus próprios esboços, o salão pudesse transformar-se num boudoir estilo Dama das Camélias (talvez em tributo ao pobre Otto, forrou as paredes com seda vermelha com rosas aplicadas e, também com seda, decorou o teto, com mais grinaldas de rosas). Vários espelhos e mesmo uma pequena alcova completavam a peça. Vetando oficiosamente visitas de sua esposa, recebia ali uma significativa quantidade de senhoras da alta sociedade, de variadas idades, cujas contribuições financeiras eram muito avidamente aceitas. Além delas, importantes admiradores como Charles Baudelaire, Gustave Doré, Charles Gounod e Camille Saint-Saëns vinham prestar homenagens e dar asas aos mais profundos delírios de poder de Richard Wagner.

Seu maior objetivo era a conquista da Opéra de Paris, teatro dominado por um repertório de óperas grandiosas e extravagantes, que refletiam o gosto da classe dominante. Desde sua abertura em 1828, o teatro era a instituição na qual a sociedade que com a Monarquia de Julho ascendera ao poder (e ao dinheiro) — os ditos parvenus — paradeava. A ópera era um dos instrumentos prediletos deste grupo para demonstrar sua riqueza e sua influência social e política. Supremo pontífice da Grand Opéra, Giacomo Meyerbeer reinava. Embora, na passagem de Wagner por Paris no início da década de 1840, tivesse tentado ajudar o jovem compositor dando-lhe cartas de recomendação, Meyerbeer agora figurava em sua fantasia como responsável por envenenar seu sucesso. Em sua autobiografia, Wagner cita supostos "subornos monstruosos" que o rival, judeu, oferecia à imprensa francesa para que esta se voltasse contra ele. Com efeito, qualquer voz meramente dissonante ou crítica era tida como parte de cabala inimiga. Mesmo os reparos de Berlioz aos cromatismos do prelúdio de Tristão e Isolada acabaram atribuídos à influência de Meyerbeer. No entanto, a verdade provavelmente residia mais próxima das palavras da princesa Pauline von Metternich: o próprio Wagner era o autor da proeza de conseguir voltar toda Paris contra si.

Casada com o embaixador austríaco, Pauline von Metternich era conhecida por suas conexões políticas. Grande admiradora de Wagner, foi a responsável por influenciar o próprio Imperador a ordenar que Tannhäuser fosse encenado. Não fosse talvez por esse expresso comando imperial à Opéra, o espetáculo provavelmente teria sido cancelado. Ao longo de 164 ensaios Wagner parece ter feito questão de portar-se de forma simplesmente insuportável com todos. Seus caprichos perturbaram de forma fatal músicos, cantores e coro e até mesmo os contrarregras e iluminadores. Dos rios de dinheiro investidos pelo governo na produção, pouco ou nada rumou para os bolsos do compositor (aonde qualquer quantia seria muito bem-vinda). Fechavam-se, tão logo abertas, as tão desejadas portas da Opéra de Paris.

Se o relativo insucesso da primeira visita do compositor à Cidade Luz, vinte anos antes, havia passado desapercebido, o resultado em 1861 foi vergonhosamente humilhante e o assunto tomou proporções inesperadas, ocupando as primeiras páginas dos mais diversos jornais. É possível que os ataques contra o protégé da princesa Pauline tivessem algo de demonstração contra a política pró-Áustria de Napoleão III. O que é certo é que o clima criado por Wagner contribuiu para que a produção parisiense de Tannhäuser fosse um enorme fiasco.

Wagner trabalhou ao longo de seis meses revisando e recriando Tannhäuser para sua estreia na Ópera de Paris, em 1861. O estilo da  versão original de Dresden, datada de quinze anos antes, já lhe era um pouco estranho. Reescreveu a cena inicial, para aproximar sua “antiga” obra da estética de Tristão e Isolda, inserindo aí o balé que era obrigatório nas óperas que pretendiam subir à cena da Salle le Peltier. Durante o Segundo Império e a Terceira República, os rapazes nobres e abastados do Jockey Club possuíam numerosos camarotes na Opéra, diversos “pequenos salões suspensos” e, grosso modo, impunham a singular regra de incluir um balé em todas as óperas, sempre após o primeiro ato. Les lions du Jockey jantavam tarde e depois rumavam para o espetáculo, chegando impreterivelmente no segundo ato. Assim, para que os cavalheiros devidamente alimentados pudessem prestigiar suas favoritas do corps de ballet, muitas delas suas amantes, era necessário que o tradicional número de dança acontecesse após o primeiro ato.         

Infelizmente, foi aí que Wagner cometeu seu maior erro: obstruir o caminho entre o olhar de jovens abastados e pernas desnudas de bailarinas. Julgando — com razão — que o único lugar dramaticamente coerente em Tannhäuser para incluir uma dança era a cena inicial em Venusberg, Wagner criou um balé em forma de bacanal para os domínios de Vênus. Inadvertidamente — ou não, afinal era Wagner — , desafiou os leões do Jockey, forçando-os a chegar a tempo para o primeiro ato e contrariando mais seriamente do que podia supor o funcionamento da Opéra. Os nobres cavalheiros da elite do Jockey Club tornaram a destruição da ópera uma questão de honra, organizando uma espetacular recepção para cumprir seu objetivo. Apitos de caça receberam Tannhäuser em meio a vaias, miados e comentários irônicos que interrompiam a todo momento a representação. A estreia, em 13 de março de 1861, transformou o mais celebrado palco de Paris num fabuloso campo de guerra. Após três únicas apresentações, Wagner foi forçado a retirar sua partitura. Sua queda estava consolidada.

Um mês depois, Wagner deixava a cidade, sentindo-se semidestruído como artista e ser humano. A experiência foi tão marcante para o compositor que, onze anos mais tarde, ainda sonhava em se vingar. Numa entrada em seu diário, Cosima Wagner registrou que o compositor escrevera ao general Bismarck sugerindo a destruição da capital francesa. Paris sobreviveu, assim como Tannhäuser e Wagner. Tanto seu mito quanto o novo discurso musical que propunha tornaram-se reverenciados por diversas gerações de compositores franceses, mais wagnerianos talvez que os próprios alemães.

Embora os caminhos do fracasso do Tannhäuser parisiense tenham sido um tanto misteriosos, com supostas cabalas inimigas, pode-se dizer que o comportamento e a personalidade de Wagner contribuíram para fazer do fiasco algo previsível. Contrariamente à luxuosa porém fracassada temporada parisiense, um período anterior, o da concepção de Rienzi, de 1837 a 1842, foi de dificuldades, mas culminou num sucesso retumbante. Então, a personalidade de Wagner, que com menos de trinta anos já era capaz de ver a si próprio como um redentor nacional, contribuiu de outra forma para o resultado final. 

Depois de passagens por Magdeburg e Königsberg, o compositor encontrava-se empregado como Kappelmeister na cidade de Riga. Infeliz e insatisfeito, regia óperas e concertos que considerava medíocres, e seu talento servia a arranjos e música adicional para obras de outros compositores. Via-se forçado a trabalhar — e exaustivamente. Tentava pagar dívidas e sobreviver, pois, mesmo sem dinheiro, vivia entre sedas e cetim, alimentado à champanhe e salmão. Em 1840, sem perspectivas, fugiu para Londres e Paris sem passaporte, já que o mesmo havia sido confiscado a pedido dos credores. Depois de uma acidentada travessia por terra e mar, chegou finalmente à capital francesa para uma primeira visita, que se mostrou pouco ou nada bem-sucedida. Apesar de tudo, o Wagner das décadas de 1830 a 1850 foi um compositor incansavelmente empenhado em obter o sucesso.

Surpreendentemente, em meio ao turbilhão de sua vida, até 1860 compôs O Holandês Voador, Tristão e Isolda, a versão original de Tannhäuser, estreada em Desdren em 1845, Lohengrin e metade do ciclo O Anel do Nibelungo. Além destes, que chegou a terminar e estrear, trabalhou ainda em pelo menos meia dúzia de projetos nunca concluídos — incluindo uma ópera que deveria chamar-se Jesus von Nazareth. Bastaria isso para provar o fôlego que tinha o compositor.

Rienzi teve origem no verão de 1837. Em Blasewitz, Wagner leu a obra homônima de Bulwer-Lytton, uma novela popular à época. Figura histórica, o tribuno romano Cola di Rienzo fora um idealista atormentado pelo declínio humano e cultural ao seu redor. O compositor percebeu o caráter politicamente explosivo da novela e identificou-se com o sofrimento do herói e com sua rebeldia contra a classe governante dos nobili. Assim como Rienzi, Wagner fantasiava ser um legítimo herdeiro real, com sangue azul correndo-lhe nas veias, e acreditava ser o raio de luz numa nação germânica degenerada e depravada. Com numerosas alterações feitas à história original, a ópera refletia muito da situação pessoal de Wagner (por exemplo, seu relacionamento com as irmãs). Foi nesse espírito que Wagner iniciou a composição, no verão de 1838. Tomava para si, não sem certa megalomania, a luta e a vida do tribuno romano; pretendia derrotar os que roubavam dos cidadãos sua herança e traíam sua gloriosa tradição. Não coincidentemente, dizia-se que Hitler apreciava esta sobre todas as outras óperas de Wagner (e há cerca de dois anos a Deutsche Oper teve de alterar seu calendário anunciado, pois uma representação de Rienzi cairia no aniversário do Führer).

Com lendária duração de seis horas, a estreia de Rienzi, em outubro de 1842, foi um triunfo e estabeleceu o nome de Wagner. Paradoxalmente, aquele que se autoproclamara o arauto de uma revolução musical e o inimigo confesso das antigas práticas teatrais triunfava, aos 27 anos, com um grande drama heroico no melhor estilo daquele que, em poucos anos, se transformaria de verdadeiro amigo em seu suposto maior inimigo: Giacomo Meyerbeer, por recomendação de quem, aliás, Rienzi foi encenada. O sucesso da estreia levaria décadas para se repetir e, curiosamente, rendeu a Wagner, tão imbuído do espírito de revolução, justamente a indicação para ser novamente Kappelmeister, desta vez na Corte Real da Saxônia. Regeria ali um repertório familiar, moldado ao gosto ultraconservador do Teatro da Corte de Dresden. Mortal, falível e tão parecido com muitos de nós, o homem Richard Wagner não tinha como recusar a se curvar ao sistema.

Nutrido e desenvolvido entre dificuldades e sonhos de grandeza, o sucesso de Rienzi deu vida renovada a um artista que, senão definitivamente acomodado, estava temporariamente adaptado ao status quo. Mais tarde, o fausto e o grand monde que cercavam o compositor na época do Tannhäuser parisiense, misturados aos mesmos sonhos de poder, se mostraram uma combinação explosiva e fracassada. Assim, dessas histórias tão ligadas à pessoa que foi Richard Wagner, formou-se também o reverenciado "mito Wagner", tal como o conhecemos hoje. Tribuno revolucionário e trovador salvo pelo amor e pela fé, ou ainda semideus, cavaleiro do Graal ou amante infeliz, por trás destas personagens já lendárias, oculta-se e revela-se Richard Wagner.

ANDRÉ HELLER-LOPES é doutor pelo King's College e professor da Escola de Música da UFRJ.



PROGRAMA

ORQUESTRA SINFÔNICA DO ESTADO DE SÃO PAULO
FRANK SHIPWAY
regente
ISABELLE FAUST violino
CORO DA OSESP
NAOMI MUNAKATA
regente

LUDWIG VAN BEETHOVEN

Concerto Para Violino em Ré Maior, Op.61
- Allegro ma Non Troppo
- Larghetto (Attaca)
- Rondó: Allegro
41 MIN

RICHARD WAGNER
Tannhäuser: Abertura
14 MIN
Tannhäuser: Música de Venusberg
7 MIN
Rienzi: Abertura
12 MIN