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PRAÇA JÚLIO PRESTES, Nº 16
01218 020 | SÃO PAULO - SP
+55 11 3367 9500
SEG A SEX – DAS 9h ÀS 18h
07
dez 2014
domingo 16h00 Quarteto Osesp
Quarteto Osesp: Villa-Lobos, Bach e Bartók


Quarteto Osesp


Programação
Sujeita a
Alterações
Johann Sebastian BACH
A Arte da Fuga: Excertos
Heitor VILLA-LOBOS
Quarteto de Cordas nº 15
Béla BARTÓK
Quarteto de Cordas nº 3
INGRESSOS
  Entre R$ 66,00 e R$ 86,00
  DOMINGO 07/DEZ/2014 16h00
Sala São Paulo
São Paulo-SP - Brasil
Notas de Programa
Com duração de mais de uma hora, o ciclo completo dos 14 “Contrapuncti” e 4 “Canoni”1 que formam A Arte da Fuga, de Johann Sebastian Bach, são “um tratado de fuga consistindo apenas nos exemplos (omitidas as explicações verbais), elevados a um alto nível artístico”.2 Didaticamente, as peças se baseiam em variações de um único tema melódico (chamado “sujeito” numa fuga), que é apresentado em sua forma original no início do “Contrapunctus I”. A série dos “Contrapuncti” segue uma ordem crescente de complexidade: os de número I a IV são fugas simples (baseadas num único sujeito), os de V a VII são contrafugas (baseadas no sujeito e em variações composicionais), os de VIII a XI são fugas duplas ou triplas (que envolvem dois ou três sujeitos), o XII e o XIII são fugas espelhadas (nas quais, magistralmente, a leitura musical pode ser feita tanto em sentido regular quanto de trás para frente); e o “Contrapunctus XIV” é uma fuga quádrupla, inacabada. 

Os “Canoni”, dispostos entre os “Contrapuncti”, são peças com apenas duas linhas melódicas, nas quais uma repete a outra em defasagem temporal. Seus títulos descrevem as diferentes técnicas utilizadas: no “Canon Alla Ottava”, a melodia é repetida a uma distância de oitava do original; no “Canon Alla Duodecima in Contrapunctu Alla Quinta”, esse intervalo é de décima segunda (uma oitava mais uma quinta); e no “Canon Per Augmentationem in Contrario Motu”, a linha repetida é aumentada (possui durações rítmicas maiores, soando mais lenta) e invertida (os intervalos musicais ascendentes tornam-se descendentes, e vice-versa, deixando a sonoridade da melodia muito diferente).

Curiosamente, A Arte da Fuga não possui indicação de instrumentação. Frequentemente executada ao órgão, instrumento idiomático da tradição contrapontística germânica, tocado com maestria por Bach, ela se adequa também perfeitamente à formação de quarteto de cordas. A ausência de indicação talvez denote uma preocupação maior do compositor com suas ideias (e ideais) musicais, para além da efemeridade de sua execução.

A trajetória de Heitor Villa-Lobos e Béla Bartók permite que tracemos interessantes paralelos. Ambos começaram precocemente na música por influência de um pai músico amador que viria a falecer cedo: Bartók perdeu o pai aos sete anos, e Villa-Lobos, aos doze. Viveram a partir de então um longo período de restrições financeiras e deram continuidade aos estudos graças ao esforço materno.

Em diferentes dimensões, ambos atuaram como músicos executantes: Villa-Lobos como violoncelista profissional e violonista amador, Bartók como pianista virtuoso de carreira internacional. Engajaram-se nos movimentos nacionalistas e modernistas de seus países e tomaram para si o enorme desafio de produzir uma ainda inexistente música erudita nacional moderna, baseada em repertórios da tradição oral.

Tanto Bartók como Villa-Lobos foram educadores influentes e deixaram um grande legado de composições voltadas ao ensino. No entanto, recusaram-se por toda a vida a dar aulas de composição, deixando seus processos criativos envoltos numa aura de mistério. A despeito de suas obras de início terem encontrado resistência em seus países, ambos produziram intensamente a vida inteira, inclusive nos períodos em que passaram por problemas de saúde (Villa-Lobos compôs seu Quarteto nº 15 num desses períodos). Pereceram os dois de câncer, deixando obras inacabadas e levando consigo muito do que talvez ainda quisessem expressar. 

Embora quase trinta anos separem as datas de composição do Quarteto nº 3 de Bartók (1926) e do Quarteto nº 15 de Villa-Lobos (1954), ambos foram escritos por compositores maduros, que já haviam trabalhado extensivamente com os repertórios tradicionais e faziam uso desses elementos num nível mais abstrato. Os dois quartetos estão ligados aos Estados Unidos: o de Villa-Lobos foi escrito nesse país, por encomenda; o de Bartók participou de um concurso de composição em Filadélfia, dividindo o primeiro prêmio com uma peça do italiano Alfredo Casella (para desgosto do compositor húngaro).

O Quarteto nº 3 de Bartók foi concebido de forma contínua, sem interrupções entre os movimentos. O terceiro e o quarto movimentos são versões modificadas do primeiro e do segundo, respectivamente — por isso receberam as indicações de “recapitulação” e “coda”.

Como é típico na obra do compositor, a peça mescla elementos advindos de diferentes tradições musicais, que nela se fundem num todo coeso e orgânico. Embora seja o quarteto mais cromático da série de seis que o compositor escreveu entre 1908 e 1939, Bartók indicou que a peça estaria, de maneira abrangente, em Dó Sustenido. De fato, há ênfase em alguns acordes tonais, mas eles são aqui tratados “como se fossem visitantes de uma terra distante e antiquada”,3 e a coesão é obtida por uma organização quase serial: pequenos motivos são variados e combinados para criar as linhas melódicas dos quatro movimentos.4 Essas variações envolvem técnicas musicais semelhantes àquelas utilizadas por Bach em suas fugas (inversão, transposição, retrogradação etc.), aqui adequadas ao ambiente pós-tonal. 

O Quarteto traz ainda alusões à música tradicional húngara, tanto em sua subestrutura, com seções de organização pentatônica (tipo de escala que Bartók encontrou na música magiar), quanto no uso de padrões melódicos e rítmicos, especialmente no segundo movimento. Recursos tímbricos também merecem nota: há arcadas sul ponticello (tocadas perto do cavalete) e con legno (usando a parte de madeira do arco), além do “pizzicato Bartók” (pinçando a corda com ênfase). 

O Quarteto nº 15 de Villa-Lobos é o penúltimo da extensa série de dezessete quartetos que o compositor escreveu entre 1915 e 1957 — e ele ainda estava trabalhando no décimo oitavo quando faleceu. Muito embora a grande inspiração de Villa-Lobos tenham sido os quartetos de Haydn, em suas últimas incursões no gênero pode-se notar a influência da polifonia de Bach. É o caso desse Quarteto nº 15, sobretudo das seções de fugato no primeiro e no último movimento — este possuindo complexas relações harmônico-motívicas5 que, como em Bartók, traçam paralelos com técnicas bachianas. O segundo movimento explora colorações tímbricas “flautadas” de harmônicos (o que rendeu à peça a alcunha de “Quarteto Dos Harmônicos” 6), combinadas apizzicatos e surdinas. O terceiro movimento é um curto scherzo de sonoridade neoclássica.

Pesquisas realizadas na última década têm desmistificado a imagem do compositor de talento genial e pouca técnica, trazendo à luz um Villa-Lobos com pleno domínio das ferramentas composicionais de sua época. Foi ele que produziu uma obra cuja organização complexa dialoga em pé de igualdade com aquela de seus contemporâneos há muito consagrados como grandes compositores do século XX.7
JÚLIA TYGEL é pianista e compositora. Doutora em Musicologia pela USP e mestre em Etnomusicologia pela Unicamp, é professora na Faculdade de Música Souza Lima e no curso de Educação Musical à Distância da UFSCar.


1. Certas edições e performances incluem outras peças, que consistem em versões dessas dezoito, além de um coral agregado postumamente à coleção por ter sido a última obra escrita pelo compositor (Bukofzer, Manfred R. Music in The Baroque Era: From Monteverdi to Bach. Nova York: W. W. Norton & Company, 1947).
2. Crooker, Richard L. A History of Musical Style. Nova York: Dover Publications, 2013 [1966], p. 39. Tradução do trecho pela autora.
3. Straus, Joseph. “The Pitch Language of The Bartók Quartets”. In: Jones, Evan (ed.). Intimate Voices: The Twentieth-Century String Quartet – Volume 1: Debussy to Villa-Lobos. Rochester: University of Rochester Press, 2009, pp. 70-111.
4. Idem. “Motivic Chains in Bartók’s Third String Quartet”. In: Twentieth Century Music, Vol. 5, Issue 1, Março 2008, pp. 22-55.
5. Salles, Paulo de Tarso. “Organização Harmônica no Movimento Final do Quarteto de Cordas nº 15 de Villa-Lobos”. In: Anais do XVIII Congresso da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música (ANPPOM), Salvador, 2008.
6. Estrella, Arnaldo. Os Quartetos de Cordas de Villa-Lobos. Rio de Janeiro: Museu Villa-Lobos, 1978.
7. Artigos sobre muitas dessas pesquisas podem ser encontrados nos anais do I e do II Simpósio Villa-Lobos, realizados em 2009 e 2012 em São Paulo por iniciativa do Prof. Dr. Paulo de Tarso Salles (ECA/USP) – que, atualmente, coordena o grupo de pesquisa PAMVILLA (Perspectivas Analíticas Para a Música de Villa-Lobos).



QUARTETO OSESP
EMMANUELE BALDINI violino
DAVI GRATON violino
PETER PAS viola
WILSON SAMPAIO violoncelo (convidado)

JOHANN SEBASTIAN BACH [1685-1750]
A Arte da Fuga [1742-50]
- Contrapunctus I
- Contrapunctus II
- Contrapunctus III
- Canon Alla Ottava
12 MIN

HEITOR VILLA-LOBOS [1887-1959]
Quarteto de Cordas nº 15 [1954]
- Allegro Non Troppo
- Moderato
- Scherzo: Vivo
- Allegro
23 MIN

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JOHANN SEBASTIAN BACH [1685-1750]
A Arte da Fuga [1742-50]
- Contrapunctus IX
- Canon Per Augmentationem in Contrario Motu
- Canon Alla Duodecima
12 MIN

BÉLA BARTÓK [1881-1945]
Quarteto de Cordas nº 3 [1927]
15 MIN