Temporada 2024
abril
s t q q s s d
<abril>
segterquaquisexsábdom
25262728293031
123 4 5 6 7
8 9101112 13 14
151617 18 19 20 21
222324 25 26 27 28
293012345
jan fev mar abr
mai jun jul ago
set out nov dez
PRAÇA JÚLIO PRESTES, Nº 16
01218 020 | SÃO PAULO - SP
+55 11 3367 9500
SEG A SEX – DAS 9h ÀS 18h
08
ago 2014
sexta-feira 21h00 Pequiá
Temporada Osesp: Guerrero e Mayboroda


Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo
Giancarlo Guerrero regente
Dmitry Mayboroda piano


Programação
Sujeita a
Alterações
Richard STRAUSS
Don Juan, Op.20
Wolfgang A. MOZART
Sinfonia nº 31 em Ré Maior, KV 297 - Paris com Andante
Edvard GRIEG
Concerto Para Piano em Lá Menor, Op.16
Bis
quinta, sexta e sábado
Pyotr I. TCHAIKOVSKY
Meditação, Op.72
INGRESSOS
  Entre R$ 36,00 e R$ 166,00
  SEXTA-FEIRA 08/AGO/2014 21h00
Sala São Paulo
São Paulo-SP - Brasil
Notas de Programa

Quando, sob a batuta de Bismarck, arquitetava-se a unificação do que hoje chamamos de Alemanha, “ferro e sangue” foi a metáfora usada para invocar o espírito germânico. Após a guerra franco-prussiana, em 1871, as artes deveriam irmanar-se à política. Em bom espírito romântico, tratava-se de banhar o passado e o futuro nas luzes regeneradoras do mito, levando a crer no caminho inelutável de um povo. Se por um lado seria equívoco reduzir a criação artística desse período à política, por outro lado é difícil compreender a força e o caráter sublime da música alemã desse momento sem o pano de fundo em que se gestavam expansivos sonhos de domínio e controle.

A música de Richard Strauss conduz a diversos estados de espírito. No entanto, escutá-la exige entregar-se a movimentos impetuosos que buscam tomar a alma a qualquer preço. Trata-se de uma rendição fáustica, como se, ao ouvir, firmássemos contrato com um demônio a um só tempo sublime e terrível. O poder depende inteiro desse pacto que, dando-lhe força extraordinária, faz o homem imaginar-se além de si mesmo, próximo da eternidade.

A Alemanha que conquistava sua unidade viveu sob o signo de Wagner. Logo após o nascimento de Strauss, sua Munique natal veria, em 1865, a estreia de Tristão e Isolda, sob a regência de Hans von Bülow, indicado pelo próprio Wagner, que então caíra nas graças de Ludovico II, rei da Bavária. Fonte de ódio e veneração, Wagner era incontornável. Primeiro trompista do Teatro da Corte de Munique, o pai de Richard Strauss detestava o autor de Tannhäuser. Em 1885, quando o filho se livrara momentaneamente do acanhado ambiente bávaro, Franz Strauss lhe escreveria rogando que seguisse os conselhos dados pelo já consagrado Brahms: evitar floreios temáticos desnecessários, almejar uma polifonia límpida, e, para tanto, estudar a simplicidade das Danças de Schubert. É claro que o caminho desejado pelo pai deveria afastar Richard da tentação wagneriana.


No entanto, conduzido por seu amigo Alexander Ritter, munido de leituras de Schopenhauer e Nietzsche, Richard Strauss se aproximaria de Wagner, para desalento do pai, entregando-se ao ideal da música como reprodução da “vontade”, para enfim lançar-se à composição de seus poemas sinfônicos. Em 1888, concebeu a obra que o projetaria definitivamente:Don Juan, Op.20, que ele próprio regeria na estreia em Weimar, no ano seguinte. 

Ainda em 1888, Strauss escreve a Von Bülow sobre os poemas sinfônicos: “Se se quer dar ao público uma impressão vívida, então o autor também deve ter tido uma forte impressão, no seu espírito, do que ele quis dizer. Isso só é possível quando há fertilização por uma ideia poética”.1 O caráter expressivo da música tomava de assalto a filosofia e a literatura, em especial na Alemanha e na França, onde o “deus Richard Wagner”, como o chamou Mallarmé num poema de 1886, era fonte de admiração e incômodo. 

Mas Strauss não buscava a potência descritiva da música. Em carta ao escritor francês Romain Rolland, pouco mais tarde, escreveria que “o programa poético não é mais que a causa inicial que empresta vida às formas, nas quais então dou expressão e desenvolvimento puramente musical aos meus sentimentos”.2 A afirmação não nos exime, contudo, da tarefa de imaginar como Strauss entendeu e expressou o drama de Don Juan. 

A primeira vez em que a lenda do libertino conquistador ganhou as páginas foi com El Burlador de Sevilla y Convidado de Piedra, publicado em 1630 e atribuído a Tirso de Molina. A partir daí, Don Juan teria uma carreira fulgurante, nas mãos de Molière, Hoffmann, Mozart, Byron, Pushkin, Liszt e Baudelaire, entre muitos outros. A inspiração de Strauss vem de um poema inacabado de Nikolaus Lenau, cujos versos apareciam nas primeiras versões da partitura de Don Juan. São três passagens em que o herói se pronuncia. Nas duas primeiras, ele rejeita os conselhos do irmão, que a mando do pai pedia que voltasse a casa e abandonasse a lassidão em que vivia. Mas o devasso insiste em ater-se ao círculo mágico (der Zauberkreis) das mulheres charmosas, permanecendo sob uma tempestade de prazer (im Sturme dês Genusses) e querendo morrer dos beijos da última delas. De mulher em mulher, a paixão é sua única paixão, e não há tempo para ver nada perecer nem é seu intuito construir um templo sobre ruínas (Nicht aus Ruinen will ich Tempel bauen).3 Mas, como em outras versões da lenda, a morte o aguarda na figura de um inimigo por quem ele paradoxalmente anseia. Desfalecido o desejo, o herói se descobre falto de forças, próximo da escuridão final.

Don Juan quebra as leis da aliança e da fidelidade e expõe o desejo que a sociedade comportada encerrava no quarto dos pais — ou no prostíbulo, talvez nos lembrasse Foucault. Se por um lado o mundo de Strauss é distante do nosso, por outro, no ímpeto de controlar e dominar o próprio corpo, ensaiava-se uma forma de política, mas também de conhecimento. A pátria de Freud não era tão longe, nem tardaria a estabelecer-se uma nova compreensão do humano e o entendimento da cultura como uma complexa rede de mecanismos repressores. Nesse quadro, domínio e controle não eram matéria exclusiva dos estadistas, interessando também à arte e talvez especialmente à música.

Entregando-se ao prazer, Don Juan pensa subtrair-se à morte. Sua aventura ininterrupta é a ilusão daquela eternidade que o mundo laicizado roubara aos homens. E como entender as passagens mais vigorosas, na peça de Strauss, sem pensar no rapto do corpo, no prazer físico que leva às alturas e conduz ao êxtase? Ao menos nisso, o romantismo é herdeiro do barroco: piedosa ou impiedosamente entregue, o corpo descobre o divino gozo, e a sacralidade é o rito sempre renovado do ser que se aproxima da morte. Místico ou mundano, o amor vale pelo arrebatamento, quando o sujeito desiste de si mesmo, esgotando-se, como Don Juan se entrega ao inimigo, ao deixar cair a espada, impotente diante da morte. Desvela-se então o corpo exangue, tão gélido quanto aquela escura lareira extinta que arremata os versos de Lenau utilizados por Strauss (Und kalt und dunkel war es auf dem Herd) e que se pode “sentir” ao final do poema sinfônico, no rufar pianíssimo dos bombos, seguido de um lindo acorde menor.

Mas logo antes dessa passagem “fria”, que conduz a alma ao Nada, e imediatamente após a pausa que encerra o mais incrível acúmulo de crescendos, ouve-se uma trompa desferir um golpe no meio de um tímido acorde de Lá Menor. Há quem tenha ouvido, na nota dissonante, a rajada de ar da espada que se desloca, fatal, em direção ao corpo de Don Juan. Desarmado e vencido, ele fenece, como a música. 

Mas antes da morte cabe ao ouvinte detectar e sentir a alegria fátua de Don Juan, seus truques risonhos, os lances heroicos ou ridículos, a festa, o orgulho, a futilidade, a leveza, o engano, a beleza, o flerte e o clímax tantas vezes experimentado, expressos desde a fenomenal abertura até os temas que, exigindo máximo virtuosismo da orquestra, projetaram Strauss no cenário musical de seu tempo e do nosso. De fato, Don Juan só é menos popular que outro de seus poemas sinfônicos, Assim Falou Zaratustra, Op.30, composto pouco depois, e lançado às estrelas pelo cinema de Kubrick.


A despeito da qualidade variável de sua produção, e passados quase cinquenta anos do sucesso de Don Juan, Strauss todavia se atinha ao ideal de uma música que conduzisse a humanidade para além de si mesma. Em 1942, quando o antissemitismo de sua juventude cedera, convertendo-se numa complicada relação com o nazismo (Strauss tinha nora e netos judeus, e perdera o cargo de diretor da Câmara de Música do Reich em 1935 por causa de uma carta enviada a Stefan Zweig e interceptada pela Gestapo, ao mesmo tempo em que assinara documento acusando Thomas Mann de manchar a cultura alemã), podemos vê-lo, já velho e cansado, a relembrar suas óperas, inclusive Salomé e Elektra, ambas singulares, a última composta a partir de libreto de Hofmannsthal. Ele escreveria: “Nelas penetrei os mais extremos confins da harmonia, da polifonia psicológica e da receptividade dos ouvidos modernos”.4 Não é uma constatação modesta, talvez porque imodesta seja a própria concepção das artes de que Strauss é herdeiro. 

Poucos anos depois, ele ainda buscaria na música o esteio de uma cultura ameaçada, que ligava a Alemanha à Grécia antiga, num novo círculo mágico: “Após a criação da música alemã por Johann Sebastian Bach, após a revelação da alma humana (buscada por todos os filósofos desde Platão) na melodia de Mozart — que eu compararia ao Eros platônico pairando entre céu e terra — e após os magníficos palácios das sinfonias de Beethoven, Richard Wagner, o poeta-dramaturgo e músico-filósofo, concluiu o desenvolvimento cultural de três mil anos ao criar a linguagem da orquestra moderna, completando o mito cristão e germânico em perfeitas criações dramático-musicais”.5

Strauss escreveu essas linhas no verão de 1945, numa Alemanha completamente arrasada. Para ele, a despeito dos escombros deixados pelo desejo de domínio, haveria ainda algo além da morte, como se um herói trágico resistisse a deixar o palco, para seguir sonhando, em júbilo eterno, com o poder de sua cultura.

PEDRO MEIRA MONTEIRO é professor titular de literatura brasileira na Princeton University. Autor, entre outros livros, de Mário de Andrade e Sérgio Buarque de Holanda: Correspondência (Companhia das Letras e Edusp/IEB, 2012; Prêmio ABL de Ensaio 2013).


1. Schuch, Willi. Richard Strauss: A Chronicle of The Early Years, 1864-1898 (Cambridge: Cambridge University Press, 1982), p. 147.

2. Ibidem., p. 149.

3. Del Mar, Norman. Richard Strauss: A Critical Commentary on His Life And Works (Ithaca: Cornell University Press, 1986), pp. 67-8.

4. Strauss, Richard. Recollections And Reflections (Ed. Willi Schuch. Westport: Greenwood Press, 1974), p. 155.

5. Ibidem., p. 90.


Um dos temas favoritos de discussões (e controvérsias) no mundo da música clássica é o aplauso entre os movimentos de uma sinfonia, concerto ou qualquer outra obra com mais de um movimento. A Sinfonia nº 31 - Paris, de Mozart, é perfeita para que se aborde a questão numa perspectiva histórica.

Essa maravilhosa sinfonia é um pouco fora do usual porque foi escrita no padrão rápido-lento-rápido, com apenas três movimentos no lugar dos costumeiros quatro — faltando o usual Minueto. Sua estreia foi em Paris, onde Mozart visitava sua mãe, em 18 de junho de 1778. A obra havia sido encomendada por Joseph Legros, diretor do Concert Spirituel. Após a première, o compositor escreveu a seu pai:

“Logo no meio do primeiro ‘Allegro’, havia um trecho que tinha certeza de que todos gostariam. Os ouvintes ficaram eletrizados e o aplauso foi tremendo. E como, ao escrever, sabia o efeito que a passagem causaria, eu a repeti perto do fim — e eles começaram a aplaudir novamente”.1

Vale lembrar que, na época de Mozart, as plateias se sentiam à vontade para aplaudir, não somente entre os movimentos de uma sinfonia, mas mesmo enquanto a música era tocada! Nós também sabemos que o movimento central — “Andante” — não foi bem-sucedido. Citando novamente uma carta de Mozart: “A plateia não aplaudiu tão entusiasticamente como nos outros movimentos”.2

Assim, Legros convenceu o compositor a escrever um “Andante” alternativo para substituir o original. Desde então, quando a Sinfonia nº 31 é programada, os regentes devem decidir qual movimento intermediário desejam apresentar: o “Andante” original, em compasso 6/8, ou o “Andantino”, em compasso 3/4, que Mozart escreveu quase imediatamente após a estreia.

Tive a oportunidade de reger essa obra diversas vezes em minha carreira e sempre tenho dificuldade em decidir: ambos os movimentos são igualmente fantásticos e demonstram a genialidade de Mozart. Recentemente, optei por apresentar ambas as versões e deixar a plateia mostrar com seus aplausos qual movimento é o mais popular. Para essas performances em São Paulo, convido a plateia a não só aplaudir à vontade após esses movimentos, mas também a usar a voz para manifestar sua preferência. Pessoalmente, acredito que a música, como toda manifestação artística, deva provocar reações e emoções nas plateias. Devemos permitir aos ouvintes que expressem livremente sua apreciação da música e dos músicos.

GIANCARLO GUERRERO.Tradução de Rodrigo Vasconcelos.

1. Mozart, Wolfgang Amadeus. A Life in Letters (Nova York: Penguin, 2006, traduzido para o inglês por Stewart Spencer).

2. Ibidem.

Ao ouvir o jovem Edvard Grieg tocar piano, o violinista Ole Bull se empenhou em convencer os pais do futuro compositor a enviá-lo para uma temporada de estudos no Conservatório de Leipzig, na época um dos mais renomados da Europa. E assim o talentoso garoto de quinze anos abandonou a bucólica cidade de Bergen, perdida no meio dos imponentes fiordes noruegueses. Na Alemanha, estudou com Ernst Ferdinand Wenzel, amigo pessoal de Mendelssohn e Schumann, de quem o pupilo se tornaria fervoroso admirador. Conta-se que Grieg ficou para sempre impactado ao ouvir Clara Schumann interpretar o Concerto Para Piano em Lá Menor de seu marido numa apresentação da Orquestra da Gewandhaus. 

Grieg comporia seu próprio Concerto Para Piano, na mesma tonalidade de Lá Menor, quando tinha apenas 25 anos. Estreado em Copenhague em 1869, o Concerto demonstra claramente a influência de Schumann, a começar pela estrondosa abertura, seguida por acordes em cascata. Com belíssimas melodias e uma cadência extremamente virtuosística, a peça arrancou aplausos entusiasmados da plateia dinamarquesa antes mesmo do final do primeiro movimento. O sucesso da composição foi imediato, fazendo o nome Grieg circular por todo o continente. 

Depois das impressionantes explosões pianísticas do primeiro movimento, o “Adagio” envolve os ouvintes numa atmosfera doce e ardente. O terceiro e último movimento retoma as exigências técnicas e traz referências à música tradicional norueguesa, tanto rítmica quanto melodicamente. O Concerto vem encantando gerações de grandes pianistas e compositores, desde Franz Liszt e, mais tarde, Sergei Rachmaninov. Não é à toa que segue sendo uma das peças mais tocadas e apreciadas do repertório.

RICARDO TEPERMAN é doutorando em Antropologia Social na Universidade de São Paulo e editor da Revista Osesp.

 

ORQUESTRA SINFÔNICA DO ESTADO DE SÃO PAULO

GIANCARLO GUERRERO regente

DMITRY MAYBORODA piano

 

WOLFGANG A. MOZART

Sinfonia nº 31 em Ré Maior, KV 297 - Paris com Andante

- Allegro Assai

- Andante

- Andantino (versão alternativa de Mozart para o segundo movimento)

- Allegro

18 MIN

 

RICHARD STRAUSS

Don Juan, Op.20
17 MIN

 

EDVARD GRIEG

Concerto Para Piano em Lá Menor, Op.16

 Allegro Molto Moderato

- Adagio (Attacca)

- Allegro Moderato Molto e Marcato - Quasi Presto - Andante Maestoso

30 MIN