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PRAÇA JÚLIO PRESTES, Nº 16
01218 020 | SÃO PAULO - SP
+55 11 3367 9500
SEG A SEX – DAS 9h ÀS 18h
24
set 2016
sábado 16h30 Mogno
Osesp: Stutzmann e Buniatishvili


Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo
Nathalie Stutzmann regente
Khatia Buniatishvili piano


Programação
Sujeita a
Alterações
Édouard LALO
O Rei de Ys: Abertura
Robert SCHUMANN
Concerto Para Piano em Lá Menor, Op.54
Georges BIZET
Sinfonia nº 1 em Dó maior
INGRESSOS
  Entre R$ 42,00 e R$ 194,00
  SÁBADO 24/SET/2016 16h30
Sala São Paulo
São Paulo-SP - Brasil
Notas de Programa

Aos dezesseis anos, Édouard Lalo decidiu fugir de casa para escapar das ordens do autoritário pai. Abandonou sua Lille natal para tentar a carreira como músico em Paris, onde teve aulas com François Antoine Habeneck e ganhou a vida como violinista e violista em algumas orquestras. Pouco tempo depois, passou a integrar o Quarteto Armingaud, o que explica em parte sua afinidade inicial como compositor de música de câmara. Mas suas obras mais expressivas serão sinfônicas: a Sinfonia Espanhola, o Concerto Para Violoncelo e a ópera O Rei de Ys.


O Rei de Ys se baseia numa antiga lenda da Bretanha, região que é o berço do Rei Arthur e de tantos outros mitos. O interesse de Lalo por esse folclore tinha uma motivação bastante pessoal: sua esposa, a contralto Julie de Maligny, era de origem bretã. A lenda em questão se passa na cidade de Ys, um centro de comércio na costa. Lá, o mar era contido por grandes diques — fonte de riqueza para a cidade e também de sua posterior extinção.


O rei de Ys promete sua filha Margared a Karnac, um dos inimigos da cidade, num gesto político para apaziguar as diferenças entre eles. Porém, Margared — como em toda boa ópera — ama secretamente outro homem, Mylio. No dia do casamento, seu amado chega à cidade e sua presença faz com que Margared desista da cerimônia e despreze seu noivo, o que causa a fúria de Karnac e do rei.


Margared então descobre que Mylio está apaixonado por outra mulher: sua irmã mais nova, Rozen. O Rei de Ys apoia a união dos dois, o que leva Margared à loucura. Ela então procura Karnac e o seduz para abrir as comportas dos diques da cidade, afundá-la no mar e acabar com o reino de seu pai. O plano dá certo; e ao ver a destruição que causou, Margared se joga no mar para tentar redimir-se com os deuses.


Auxiliado por seu libretista Édouard Blau (um dos colaboradores de Massenet em Werther), Lalo suprimiu esse final trágico e criou uma versão feliz: nela, São Corentin, padroeiro da cidade, observa do céu o remorso de Margared e seu sacrifício. A estátua do santo ganha vida e consegue acalmar as ondas e salvar a cidade.


A escolha da mitologia como tema pode ser um dos ecos da influência que Wagner exercia em quatodos os compositores franceses da época. A orquestração também segue os moldes do mestre alemão, em sua grandiosidade e eloquência, mas Lalo obtém resultados bastante originais.


Como era costume, a “Abertura” apresenta os elementos que serão trabalhados ao longo da ópera, os leitmotivs dos personagens e o clima geral do enredo. Por exemplo, o dueto “En Silence Pourquoi Souffrir?” é apresentado na abertura na forma de um solo de violoncelo.


Lalo escreveu O Rei de Ys entre 1875 e 1878. Porém, a estreia da ópera completa levou treze anos para ocorrer, na Opéra Comique, em Paris. O sucesso foi imediato, tanto de público quanto de crítica, e seguiram-se montagens nos principais palcos líricos do mundo, como Metropolitan, em Nova York, e Royal Opera House, em Londres. A “Abertura” figura como uma das obras mais tocadas de Lalo.


Georges Bizet. A simples menção ao nome do compositor nos traz à mente, no mesmo instante, os conhecidos temas de sua obra-prima Carmen, escrita no ano de sua morte. Talvez alguns deem um passo adiante e o associem a Nietzsche, que mesmo imbricado no seu niilismo era um confesso apaixonado pela ópera solar de Bizet. Mas vale ir além e conhecer um pouco mais de umas das figuras mais instigantes do mundo musical francês do século xix.


Assim como Mozart, Schubert e Mendelssohn, Alexandre César Léopold Bizet (como foi registrado) também faleceu precocemente, aos 36 anos. E, como eles, foi uma criança-prodígio: com apenas nove anos, ingressou no Conservatório de Paris, e em 1855, aos dezessete anos, compunha em menos de um mês sua Sinfonia nº 1 em Dó Maior.


A peça não foi interpretada em vida do compositor. Dois anos após escrevê-la, Bizet recebeu o Prix de Rome e, como parte do prêmio, ficou cinco anos entre a Itália e a França, dedicando-se apenas à composição e contrariando conselhos de amigos como Franz Liszt, que sugeria ao jovem amigo uma carreira de instrumentista.


Após a morte precoce do compositor, em 1875, sua viúva, Geneviève Halévy, entregou o manuscrito da Sinfonia nº 1 ao maestro Reynaldo Hahn, que o guardou com outros documentos nos arquivos da Biblioteca do Conservatório de Paris. Inédita, a obra submergiu no esquecimento.


Quase sessenta anos se passaram até que o manuscrito fosse encontrado, em 1933, pelo musicólogo Jean Chantavoine. Dois anos depois, a Sinfonia pôde, enfim, ter sua estreia com o maestro Felix Weingartner, na Basileia (Suíça).


O fato de Bizet não ter se empenhado em publicar a obra em vida, ou sequer tê-la mencionado em correspondências, é motivo de diversas especulações. A Sinfonia em Dó Maior apresenta semelhanças importantes, em termos de estrutura e estilo, com a primeira sinfonia de outro compositor: Charles Gounod, professor de Bizet e um dos mais reconhecidos músicos de seu tempo. Outro detalhe importante é que a obra de Gounod foi escrita no mesmo período e apresentada nove vezes em seu ano de estreia. Essa semelhança, que pode beirar a emulação, era possivelmente reconhecida por Bizet, e o seu desinteresse em publicá-la talvez fosse uma atitude deliberada para evitar comparações indesejáveis. Com a licença do comentário anacrônico, essa não teria sido uma preocupação para o jovem Bizet, caso tivesse podido ouvir o conselho de Stravinsky: “O bom compositor não imita, rouba”.


Vale ressaltar também que a sinfonia não era o gênero mais em voga na França na segunda metade do século xix, e sim a ópera, o que levanta outra possibilidade: a do simples descaso de Bizet com sua a obra, que talvez tratasse como um exercício teórico, e não como a expressão mais completa de sua arte. No entanto, a despeito desse início aparentemente pouco promissor, a Sinfonia nº 1, com sua sofisticada estrutura harmônica e grande inspiração melódica, terminou por garantir lugar fixo no repertório das salas de concerto e hoje figura como uma das obras mais populares do compositor — ao lado da estrela inconteste Carmen e da música incidental L’Arlésienne.

 

A peça serviu de mote para um espetáculo de dança homônimo do coreógrafo George Balanchine, na década de 1940 e, mais recentemente, fez parte da trilha-sonora de A Grande Beleza, filme de Paolo Sorrentino. A Sinfonia nº 1, de Gounod, por outro lado, hoje é praticamente desconhecida.


ISABELA PULFER é assessora artística da Osesp.

 

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Acostumado a compor peças para piano de pequeno formato, Schumann entregou-se, em 1841, ao desafio de conceber uma obra de fôlego sinfônico para esse seu instrumento predileto e aparato orquestral (que não dominava tão bem), o que resultou numa Fantasia em Lá Menor. A obra era dedicada à sua mulher, a grande pianista Clara Wieck, que percebeu nela a porção inicial de um verdadeiro concerto em três movimentos.


Quatro anos depois, em 1845, Schumann completou os movimentos faltantes, dedicando o (agora) Concerto ao pianista e compositor Ferdinand Hiller. Foi esse artista quem o estreou, em Leipzig, com sucesso triunfal. Nada levava a imaginar que um considerável período de tempo separava a composição das diferentes seções do Concerto, ainda mais sabendo que o humor do músico variava constantemente entre a pior depressão e a mais entusiasmada euforia. Todo o Concerto, em que o autor dizia ver uma encarnação do seu mundo interior, está alimentado por uma imaginação melódica que parece não ter limites. Foi isso, talvez, o que fez com que se tornasse o que continua a ser ainda hoje: um dos concertos para piano mais populares de todo o repertório.


O “Allegro Affettuoso” inicial é aberto por uma curta e provocante introdução, da qual o piano já participa. Tem-se, então, nas madeiras e trompas, o tema fundamental do movimento: oito compassos contendo uma das mais belas inspirações melódicas do compositor, na tonalidade de Lá Menor. É esse motivo que irriga o movimento inteiro com ímpeto, ora apresentado em tom maior, ora com seu ritmo engenhosamente modificado.


É dessa maneira que Schumann consegue emprestar ao movimento, a um só tempo, variedade e unidade. Isso por meio de uma escrita que, pelo tom de liberdade, lembra uma autêntica improvisação.


O movimento central, “Intermezzo: Andantino Grazioso”, tem uma forma ternária simples (A-B-A), em cuja primeira parte solista e orquestra trocam frases curtas, marcadas pela clareza e pela transparência da parte de acompanhamento. O episódio central (B) fornece a ideia contrastante, em Dó Maior: um generoso fio melódico a cargo dos violoncelos e, depois, dos violinos. Sobre ele, o solista risca arabescos. Antes do final do movimento, quando já se voltou à sua primeira parte (A), a orquestra surpreende fazendo reaparecer o tema principal do primeiro andamento, ligando o “Intermezzo” diretamente ao movimento final.


O “Finale” é um allegro efetivamente vivace. Baseia-se em dois temas principais de caráter diverso. O primeiro motivo, de perfil ascendente, é mostrado pelo piano nos primeiros compassos. O segundo tema aparece depois com ritmo inesperadamente assimétrico, que leva a música a soar titubeante. O oboé exibe, então, um motivo que o piano logo assimila. Sobre esse material, o compositor articula o brilhante final, fazendo uso de contrapontos e de jogos de iluminação conseguidos por meio de modulações inesperadas. A brilhante coda de encerramento mostra, uma vez mais, o motivo principal da obra, só que com tratamento rítmico diferente de tudo o que havia sido apresentado.

[2010]

ANDRÉ MEHMARI é pianista e compositor.